Astronomia

As Estrelas Variáveis: Pulsações Cósmicas no Céu Noturno

Este grupo de estrelas jovens é o enxame estelar aberto NGC 3766, na constelação do Centauro. Um grupo de investigadores do Observatório de Genebra obteve observações extremamente cuidadas destas estrelas, com o auxílio do telescópio suíço de 1,2 metros, Leonhard Euler, instalado no Observatório de La Silla, no Chile. As observações mostraram que 36 destas estrelas pertencem a uma classe de estrelas variáveis, nova e desconhecida até agora. Esta imagem foi obtida com o telescópio MPG/ESO de 2,2 metros, instalado no Observatório de La Silla.

Imaginem um universo onde as estrelas, longe de serem faróis imutáveis no céu noturno, pulsam com vida própria, alterando o seu brilho numa dança cósmica fascinante. Este não é um cenário de ficção científica, mas a realidade maravilhosa das estrelas variáveis. Estas estrelas misteriosas e cativantes são como os batimentos cardíacos do cosmos, revelando segredos profundos sobre a estrutura, evolução e até o próprio tecido do espaço-tempo.

As estrelas variáveis são astros cujo brilho aparente, visto da Terra, muda ao longo do tempo. Algumas piscam como pirilampos cósmicos, outras explodem em erupções de luz deslumbrantes, e outras ainda oscilam subtilmente, quase imperceptíveis ao olho desatento. Cada variação conta uma história única sobre a vida e morte das estrelas, os processos físicos que ocorrem no seu interior e as forças fundamentais que moldam o nosso universo.

Nesta viagem pelo mundo das estrelas variáveis, vamos explorar a sua descoberta revolucionária, mergulhar nas suas diversas classificações, maravilhar-nos com os seus tipos mais fascinantes, e descobrir factos surpreendentes que desafiam a nossa compreensão do cosmos. Prepare-se para uma odisseia estelar que irá expandir os horizontes da tua imaginação e revelar um universo mais dinâmico e pulsante do que alguma vez sonhámos.

A Sua Descoberta

A história da descoberta das estrelas variáveis é tão fascinante quanto as próprias estrelas. Remonta-nos ao século XVI, uma época em que o cosmos era ainda visto como uma esfera imutável e perfeita, conforme descrito por Aristóteles séculos antes.

Foi em 1572 que o astrónomo dinamarquês Tycho Brahe observou uma “nova estrela” na constelação de Cassiopeia, tão brilhante que era visível durante o dia. Esta observação, documentada no seu livro “De nova stella”, desafiou a visão aristotélica do universo imutável e lançou as sementes para a descoberta das estrelas variáveis.

No entanto, a primeira estrela variável reconhecida como tal foi Mira (ο Ceti), descoberta pelo astrónomo alemão David Fabricius a 3 de Agosto em 1596, essa gigante vermelha varia seu brilho de forma notável a cada 332 dias, desaparecendo completamente e depois retornando com intensidade, um comportamento nunca antes observado numa estrela. Essa descoberta foi um choque para os astrónomos da época, que acreditavam que os céus eram imutáveis. A comunicação desta descoberta foi feita principalmente através de correspondência com outros astrónomos da época., marcando o início oficial do estudo das estrelas variáveis.

O estudo sistemático das estrelas variáveis começou no século XVIII com John Goodricke, um astrónomo amador surdo-mudo inglês. Em 1784, Goodricke descobriu a periodicidade da variável Algol (β Persei) e propôs corretamente que as suas variações eram causadas por um sistema de estrelas binárias eclipsantes. As suas observações meticulosas lançaram as bases para o estudo moderno das estrelas variáveis.

Neste artigo, Goodricke detalha as suas observações de Algol e propõe a sua teoria sobre a causa das variações de brilho da estrela. Este trabalho é considerado fundamental no estudo das estrelas variáveis. A evolução do seu pensamento sobre este assunto pode ser traçada através das suas várias comunicações à Royal Society. Para uma visão mais abrangente do trabalho de Goodricke e do seu impacto no campo da astronomia variável, recomendo a seguinte leitura: French, L. M. (2012). John Goodricke, Edward Pigott, and Their Study of Variable Stars. Este artigo fornece um excelente resumo das contribuições de Goodricke e do contexto histórico do seu trabalho.

À medida que os instrumentos de observação melhoraram, mais estrelas variáveis foram descobertas. Edward Pigott, contemporâneo e colaborador de Goodricke, descobriu a variabilidade de η Aquilae em 1784, a primeira Cefeida conhecida. No entanto, foi Henrietta Swan Leavitt, no início do século XX, quem fez uma das descobertas mais importantes no campo. Trabalhando no Harvard College Observatory, Leavitt descobriu a relação período-luminosidade nas estrelas variáveis Cefeidas, uma descoberta que revolucionou a nossa compreensão do universo e permitiu medir distâncias cósmicas com precisão sem precedentes.

Estas descobertas pioneiras abriram as portas para um novo ramo da astronomia, transformando a nossa compreensão do cosmos de um reino estático e imutável para um universo dinâmico e em constante mudança.

A Classificação das Estrelas Variáveis

As estrelas variáveis são um grupo diversificado de objetos celestes, cada um com as suas próprias características e mecanismos de variabilidade. Para compreender melhor este vasto universo de estrelas pulsantes, os astrónomos desenvolveram um sistema de classificação detalhado. Vamos explorar as principais categorias:

Uma imagem infravermelha de Proxima Centauri, a estrela mais próxima da Terra (para além do Sol) e uma estrela flamejante. Da galeria de imagens 2MASS Atlas. Imagem do Atlas cortesia de 2MASS/UMass/IPAC-Caltech/NASA/NSF.

Variáveis Eruptivas

As estrelas variáveis eruptivas são verdadeiros fogos de artifício cósmicos. Estas estrelas experimentam erupções súbitas e dramáticas na sua superfície ou na sua atmosfera, resultando em aumentos espetaculares de brilho.

Um exemplo fascinante é a classe das estrelas variáveis T Tauri, nomeadas após o seu protótipo na constelação do Touro. Estas são estrelas jovens, ainda em formação, com menos de 10 milhões de anos – praticamente bebés em termos estelares! As T Tauri são conhecidas pelas suas erupções irregulares e imprevisíveis, causadas por intensas atividades magnéticas e interações com o disco de acreção que as rodeia.

Outro tipo notável são as variáveis UV Ceti, também conhecidas como estrelas flamejantes. Estas anãs vermelhas podem aumentar o seu brilho em questão de minutos devido a enormes erupções magnéticas na sua superfície, semelhantes às erupções solares, mas em escala muito maior.

Variáveis Pulsantes

As estrelas variáveis pulsantes são, talvez, as mais poéticas do cosmos. Estas estrelas expandem-se e contraem-se ritmicamente, alterando o seu tamanho e temperatura, e consequentemente o seu brilho.

As Cefeidas são o exemplo mais famoso desta categoria. Nomeadas após o seu protótipo, δ Cephei, estas supergigantes amarelas pulsam com períodos de dias a meses. A sua importância não pode ser subestimada – a relação período-luminosidade descoberta por Henrietta Leavitt nestas estrelas tornou-as “velas padrão” cruciais para medir distâncias no universo.

Outro tipo fascinante são as variáveis RR Lyrae, estrelas mais antigas e menos massivas que as Cefeidas. Com períodos mais curtos, tipicamente menos de um dia, estas estrelas são importantes indicadores da estrutura e evolução da Via Láctea.

Variáveis Rotacionais

As estrelas variáveis rotacionais são como faróis cósmicos girando no espaço. A sua variabilidade não se deve a mudanças físicas intrínsecas, mas sim a características da sua superfície que se tornam visíveis à medida que a estrela roda.

Um exemplo intrigante são as estrelas variáveis α2 Canum Venaticorum (α2 CVn). Estas estrelas têm campos magnéticos intensos e distribuições não uniformes de elementos químicos na sua superfície. À medida que rotam, diferentes regiões da superfície tornam-se visíveis, causando variações no brilho e no espectro.

Variáveis Cataclísmicas

As estrelas variáveis cataclísmicas são o equivalente cósmico a fogos de artifício. Estas estrelas experimentam erupções violentas e dramáticas que podem aumentar o seu brilho em milhares de vezes.

As novas são um exemplo clássico. Ocorrem em sistemas binários onde uma anã branca acreta material de uma companheira. Quando suficiente material se acumula, desencadeia-se uma explosão termonuclear na superfície da anã branca, causando um aumento dramático no brilho.

As supernovas, embora tecnicamente não sejam estrelas variáveis no sentido tradicional, são o epítome dos eventos cataclísmicos. Estes eventos marcam o fim explosivo da vida de algumas estrelas e podem brilhar mais do que galáxias inteiras.

Sistemas Binários Eclipsantes

Os sistemas binários eclipsantes são como um ballet cósmico. Consistem em pares de estrelas orbitando um centro de massa comum. À medida que uma estrela passa em frente à outra do nosso ponto de vista, bloqueia parte da luz, causando uma diminuição periódica no brilho total do sistema.

Algol, também conhecida como β Persei, é o exemplo mais famoso. O seu comportamento foi explicado corretamente por John Goodricke em 1783, marcando uma das primeiras compreensões corretas de um sistema binário.

Sistemas Binários com Fontes Intensas de Raios-X

Estes sistemas exóticos consistem tipicamente numa estrela normal e num objeto compacto – uma anã branca, estrela de neutrões ou buraco negro. À medida que o material da estrela normal é atraído para o objeto compacto, é aquecido a temperaturas extremas, emitindo raios-X intensos.

Visão artística de Cygnus X-1

Cygnus X-1, o primeiro candidato a buraco negro identificado, é um exemplo notável deste tipo de sistema. A sua descoberta em 1964 abriu um novo capítulo na astrofísica de altas energias.

Cada uma destas classes de estrelas variáveis oferece uma janela única para os processos físicos que moldam o nosso universo, desde a formação estelar até aos estágios finais da evolução das estrelas. O estudo destas estrelas continua a desafiar e expandir a nossa compreensão do cosmos.

Os Tipos de Estrelas Variáveis

Embora tenhamos explorado as classificações gerais das estrelas variáveis, alguns tipos específicos merecem uma atenção especial devido à sua importância científica e ao seu papel fundamental na nossa compreensão do universo.

Cefeidas: As Réguas do Cosmos

As estrelas variáveis Cefeidas são verdadeiramente as “réguas padrão” do universo. Batizadas em honra da estrela Delta Cephei (δ Cephei), estas gigantes pulsantes têm um papel crucial na medição de distâncias cósmicas.

Imagine uma lâmpada cósmica que pisca com um ritmo preciso e previsível. É exatamente assim que as Cefeidas se comportam! Estas estrelas supergigantes amarelas expandem-se e contraem-se periodicamente, variando em brilho com uma regularidade impressionante, expandindo-se e contraindo-se em ciclos que podem durar de alguns dias a meses. O período dessa variação está diretamente ligado à luminosidade intrínseca da estrela.

O que torna as Cefeidas tão especiais é a relação direta entre o seu período de pulsação e a sua luminosidade intrínseca. Esta relação, descoberta pela astrónoma Henrietta Swan Leavitt em 1908, permite-nos medir distâncias cósmicas com uma precisão sem precedentes.

Esta descoberta revolucionária permitiu aos astrónomos calcular distâncias inimagináveis no universo. Quando observamos uma Cefeida numa galáxia distante, podemos determinar a sua luminosidade real com base no seu período de pulsação. Comparando essa luminosidade com o brilho aparente que vemos da Terra, conseguimos calcular a distância até à galáxia hospedeira.

As Cefeidas pulsam devido a um mecanismo fascinante no seu interior. Quando a estrela se contrai, o hélio nas suas camadas externas torna-se opaco, retendo o calor. Isto faz com que a estrela se expanda. À medida que expande, o hélio arrefece e torna-se transparente, permitindo que o calor escape. A gravidade então faz a estrela contrair novamente, e o ciclo recomeça.

As Cefeidas desempenharam um papel crucial na resolução do “Grande Debate” sobre a natureza das nebulosas espirais. Em 1924, Edwin Hubble usou Cefeidas para demonstrar que a galáxia de Andrómeda estava muito além dos limites da Via Láctea, provando que era uma galáxia separada. Esta descoberta expandiu drasticamente a nossa compreensão do tamanho e da estrutura do universo.

Variáveis RR Lyrae: As Anciãs Rítmicas

Se as Cefeidas são as réguas do cosmos, as estrelas variáveis RR Lyrae são os seus metrônomos antigos. Estas estrelas pulsantes, mais velhas e menos massivas que as Cefeidas, têm períodos muito mais curtos, geralmente menos de um dia.

As RR Lyrae são encontradas principalmente em aglomerados globulares – coleções esféricas de estrelas antigas que orbitam o centro das galáxias. Estas estrelas são verdadeiras sobreviventes cósmicas, com idades que podem ultrapassar os 10 mil milhões de anos!

O que torna as RR Lyrae tão especiais é a sua uniformidade. Todas têm aproximadamente a mesma luminosidade intrínseca, o que as torna excelentes “velas padrão” para medir distâncias dentro da nossa galáxia e nas suas vizinhas mais próximas.

As pulsações das RR Lyrae são causadas por um mecanismo semelhante ao das Cefeidas, mas ocorrem em estrelas que já passaram pela fase de gigante vermelha e estão agora a “queimar” hélio nos seus núcleos.

Vela Padrão

As “velas padrão” não são um tipo específico de estrela variável, mas sim um termo usado para descrever qualquer classe de objetos astronómicos cuja luminosidade intrínseca possa ser determinada independentemente da sua distância. As Cefeidas e as RR Lyrae são exemplos clássicos de velas padrão.

No entanto, o conceito de vela padrão estende-se além das estrelas variáveis. Por exemplo, as supernovas do tipo Ia, que resultam da explosão de anãs brancas em sistemas binários, são consideradas excelentes velas padrão para medir distâncias em escalas cosmológicas.

A importância das velas padrão na cosmologia não pode ser subestimada. Elas permitiram-nos medir a taxa de expansão do universo e levaram à descoberta surpreendente de que esta expansão está a acelerar, uma descoberta que valeu o Prémio Nobel de Física em 2011.

Variáveis Mira: As Gigantes Vermelhas Pulsantes

Imagine uma estrela que, ao longo de quase um ano, aumenta o seu brilho em centenas ou até milhares de vezes, apenas para depois desvanecer novamente na obscuridade. Estas são as variáveis Mira, nomeadas em homenagem à estrela Mira (ο Ceti), a primeira estrela variável a ser descoberta.

As Mira são estrelas gigantes vermelhas nos estágios finais das suas vidas. Com diâmetros que podem ser centenas de vezes maiores que o do nosso Sol, estas estrelas têm atmosferas externas tão difusas que pulsam dramaticamente.

O que torna as Mira verdadeiramente fascinantes é a sua capacidade de criar e expelir elementos pesados para o espaço interestelar. À medida que pulsam, estas estrelas ejetam camadas de gás rico em carbono e outros elementos, contribuindo para o enriquecimento químico do universo.

Curiosamente, as variações de brilho das Mira são tão dramáticas que algumas, como a própria Mira, podem ser vistas a olho nu quando estão no seu máximo brilho, apenas para desaparecerem completamente da vista quando estão no seu mínimo.

Factos Curiosos

Nebulosa de Homúnculo em torno da Eta Carinae (imagem visual e HST UV).

O Enigma de Eta Carinae

Entre as estrelas variáveis, poucas são tão enigmáticas quanto Eta Carinae. Esta hipergigante luminosa azul, localizada a cerca de 7.500 anos-luz da Terra, passou por um evento cataclísmico no século XIX conhecido como a “Grande Erupção”.

Durante este evento, Eta Carinae expeliu uma quantidade de massa equivalente a 10 vezes a massa do nosso Sol, criando a deslumbrante Nebulosa do Homúnculo que a envolve hoje. O mais intrigante é que a estrela sobreviveu a esta erupção maciça, desafiando os modelos de evolução estelar que temos.

Atualmente, Eta Carinae é um sistema binário, com a estrela companheira orbitando a cada 5,5 anos. Esta dança cósmica resulta em variações periódicas de brilho e em erupções de raios-X que têm deixado os astrónomos perplexos.

As Variáveis Cataclísmicas: Vampiros Estelares

Imagine um sistema estelar onde uma anã branca, o núcleo compacto e denso de uma estrela morta, está a “roubar” material de uma estrela companheira. Estas são as variáveis cataclísmicas, e o seu comportamento é tão dramático quanto o nome sugere.

À medida que o material da estrela companheira se acumula na superfície da anã branca, pode desencadear explosões termonucleares periódicas. Nos casos mais extremos, conhecidos como novas, estas explosões podem aumentar o brilho do sistema em milhares de vezes em questão de horas!

Ainda mais fascinante é o facto de algumas dessas variáveis cataclísmicas poderem ser as precursoras de supernovas do tipo Ia, explosões cósmicas tão brilhantes que podem superar o brilho de galáxias inteiras.

Conceção artística.

O Mistério das Estrelas Variáveis Azuis

Em 2019, os astrónomos descobriram um novo tipo de estrela variável pulsante: as estrelas variáveis azuis. O que torna estas estrelas tão intrigantes é que elas pulsam numa frequência muito mais alta do que seria esperado para estrelas do seu tipo.

Estas estrelas, encontradas no Grande Aglomerado de Magalhães, uma galáxia satélite da Via Láctea, pulsam a cada 5 a 40 minutos – uma frequência surpreendentemente alta para estrelas tão massivas e brilhantes.

Os cientistas ainda estão a tentar entender o mecanismo por trás destas pulsações rápidas, e a descoberta desafia os nossos modelos atuais de evolução e pulsação estelar.

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