O Impacto do Cometa Shoemaker-Levy 9 em Júpiter: Um Marco na Astronomia – 30 anos

O cometa Shoemaker-Levy 9 (SL9) é uma das ocorrências astronómicas mais significativas do século XX. Há 30 anos, em julho de 1994, o cometa colidiu com Júpiter, oferecendo uma oportunidade única para a comunidade científica estudar diretamente os efeitos de um impacto cósmico num planeta gigante. Este evento não só nos proporcionou informação valiosa sobre a composição de Júpiter e os mecanismos de impacto, como também despertou o interesse do público pela astronomia.

Os cometas são corpos celestes compostos principalmente por gelo, poeira e gases congelados. Oriundos das regiões mais distantes do sistema solar, como a Nuvem de Oort e o Cinturão de Kuiper, eles tornam-se visíveis quando se aproximam do Sol. O calor solar provoca a sublimação dos materiais gelados, formando uma coma (cabeleira) e uma cauda que podem se estender por milhões de quilómetros. Os cometas são frequentemente descritos como “bolas de neve sujas” devido à sua composição mista de gelo e poeira. Fotografia do cometa 12P/Pons-Brooks, copyright DAN BARTLETT.

O cometa Shoemaker-Levy 9 foi descoberto a 24 de março de 1993 pelos astrónomos Carolyn e Eugene Shoemaker e David Levy, enquanto examinavam fotografias do Observatório Palomar. A descoberta revelou um cometa fragmentado, resultado de uma passagem anterior próxima de Júpiter, onde a força gravitacional do planeta o partiu em várias partes. As observações iniciais indicavam que os fragmentos estavam em rota de colisão com Júpiter, um fenómeno nunca antes observado.

Por NASA, ESA, and H. Weaver and E. Smith (STScI) – Domínio público.

Impacto em Júpiter

Entre 16 e 22 de julho de 1994, os fragmentos do cometa Shoemaker-Levy 9 colidiram com Júpiter num evento sem precedentes na história da astronomia moderna. Esta série de impactos resultou da fragmentação do cometa numa passagem anterior pelo campo gravitacional de Júpiter, que partiu o cometa em pelo menos 21 grandes fragmentos, designados de A a W.

A trajetória dos fragmentos do SL9 foi calculada com precisão, revelando que eles se aproximavam de Júpiter a uma velocidade de aproximadamente 60 km/s (216.000 km/h). Cada fragmento seguiu uma rota de colisão com o planeta, atingindo a sua atmosfera numa sequência espetacular e ordenada. As colisões ocorreram na face de Júpiter que estava voltada para o lado oposto da Terra, mas a rotação rápida do planeta permitiu que as manchas de impacto se tornassem visíveis pouco depois.

Por NASA/STScI Hubble Space Telescope Comet Team – Domínio público.

Cada impacto teve uma energia equivalente a milhões de megatoneladas de TNT, liberando mais energia do que todas as armas nucleares existentes na Terra combinadas. O fragmento G, um dos maiores, gerou uma explosão estimada em 6 milhões de megatoneladas de TNT. A temperatura dos locais de impacto atingiu valores altíssimos, estimados em até 24.000 K (aproximadamente 23.727 °C), causando enormes plumas de material que subiram centenas de quilómetros acima das camadas de nuvens de Júpiter.

Os impactos deixaram marcas escuras na atmosfera de Júpiter, cada uma com diâmetros que variavam de centenas a milhares de quilómetros. Estas manchas, formadas por partículas ejetadas e mudanças na composição química da atmosfera, eram visíveis por telescópios na Terra durante vários meses. As observações revelaram que os impactos criaram ondas na atmosfera joviana, semelhantes a ondas de choque, que se propagaram em todas as direções a partir dos pontos de impacto.

Os impactos do SL9 forneceram dados valiosos sobre a composição da atmosfera de Júpiter. As observações espectroscópicas detetaram a presença de amoníaco, sulfuretos e diversos hidrocarbonetos, como metano e etileno, que foram libertados ou formados devido à energia dos impactos. Estes compostos ajudaram os cientistas a compreender melhor a química e a dinâmica da atmosfera joviana.

Os impactos foram observados por uma série de telescópios terrestres e espaciais. O Telescópio Espacial Hubble forneceu imagens de alta resolução dos locais de impacto, enquanto a sonda Galileo, que estava a caminho de Júpiter, capturou dados detalhados sobre as plumas ejetadas. Estas observações foram complementadas por telescópios em terra, como o Observatório Keck no Havai e o Very Large Array no Novo México, que forneceram imagens e dados espectroscópicos cruciais.

Como era o Mundo e Portugal nessa Época

Em 1994, o mundo passava por transformações significativas. A Internet começava a ganhar popularidade, mudando como as pessoas se comunicavam e acediam à informação. Em Portugal, o país vivia um período de crescimento económico e modernização, com destaque para a preparação da Expo 98, um evento que projetaria o país no cenário internacional. A televisão por cabo começava a expandir-se, trazendo mais canais e conteúdos diversos, incluindo documentários científicos que ajudaram a popularizar eventos como o impacto do SL9.

Experiência Pessoal

Este foi um evento que me marcou definitivamente e que me trouxe para o mundo da astronomia de amadores. O impacto dos fragmentos do cometa Shoemaker-Levy 9 em Júpiter, foi um evento sem igual na história da astronomia moderna.

Portanto, em 1994, estaria eu num destes dias na Sra. do Monte, em Leiria, com outro “maluco” destas coisas (Carlos Reis Silva), com um telescópio refletor de 160mm, a tentarem ver as consequências dos impactos na superfície do gigante gasoso.

E vimos, vimos Júpiter e apenas Júpiter por aquele pequeno e tosco aparelho salvo erro todo feito à mão pelo outro “maluco”. Sim, sim, naquela altura ter um telescópio “comprado” era um luxo que não estava ao alcance de qualquer um.

Nada mais conseguimos ver, nem impactos, nem explosões, nem manchas… Além disso, sem bem me lembro, depois ficou um nevoeiro cerrado e ficou tudo tapado. Mas dali saiu a centelha para uma paixão que dura até hoje. Obrigado Carlos Reis Silva. – João Clérigo – 2024-07-16

“Já passou assim tanto tempo?  lembro-me bem dessa noite! Sim, levamos um telescópio tipo Newton que eu tinha feito à mão. Eram outros tempos. Naquela altura não havia o mercado de equipamentos que há hoje e era muito raro encontrar alguém com um telescópio digo desse nome. Só mesmo alguns “malucos” se prestavam a isso. Esta nossa vontade de perceber o que estava à nossa volta em termos do universo, levou nos a muitos lugares e caminhos, levou nos a conhecer muitas pessoas ligadas pela mesma paixão, mas sobretudo levou a que pudéssemos mostrar a largas centenas de milhares de pessoas que passaram pelos nossos telescópios ao longo de mais de 20 anos, as maravilhas do universo e certamente ficaram com um pouco mais de conhecimento e ambos sabemos que igualmente incutimos este “bichinho” a muitos outros, tendo alguns mesmo seguindo uma carreira profissional. Por tudo isto também te estou grato a ti João Clérigo por teres feito parte desta nossa saudável “loucura”. Obrigado ” – Carlos Reis Silva – 2024-07-17

“Caros amigos, vocês realmente são de outro tempo, mas é engraçado lembrar esses episódios, pois nesse tempo a astronomia era um passatempo caro ou então nós é que ganhávamos pouco. Em 94 tínhamos, no entanto, já uma vantagem. Para quem tinha dinheiro podia comprar um telescópio em França ou em Espanha e já não pagava alfandega. Portanto, já era uma sorte. Mas era preciso ter dinheiro. Lembro-me que os LX 200 quando chegaram a França no Verão de 92, o de 8 polegadas custava 700 e muitos contos, ora o ordenado mínimo nesse tempo eram para aí 50 contos. Portanto, não era para qualquer um. E recuando mais no tempo, aos anos 80, a Meade chegou a ter um representante em Portugal, que era o Fernando Barros, que tinha uma empresa de contabilidade (Contabilex) e vendia telescópios da Meade. E nesse tempo eram pequenas fortunas. Portanto, só um gajo rico é que podia comprar um telescópio…” – Jose Augusto Matos – 2024-07-21

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